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Ele começou plantando ervilha, virou garçom, maître e hoje comanda um dos mais conceituados restaurantes de São Paulo

Por Danilo Viegas

“Maravilhoso!”. Esse era o bordão do carismático garçom Juscelino Pereira nos anos 90. O adjetivo era sempre usado quando os clientes escolhiam qualquer prato do cardápio. “E não falava isso da boca pra fora. Conhecia a fundo os restaurantes em que trabalhei. Então podia afirmar que a escolha, qualquer que fosse, era de fato maravilhosa”, diz.

A simpatia, o gosto por servir, a persistência e o tino para negócios foram itens fundamentais na trajetória deste ex-garçom, que estudou somente até a oitava série, e hoje comanda vários dos mais conceituados restaurantes de São Paulo: Piselli, Piselli Sud, Timo e El Carbón.

A ervilha

Nascido em Joanópolis, interior de São Paulo, desde cedo Juscelino - nome dado pelo avô em homenagem ao presidente JK - se mostrava um “microempreendedor”, como ele mesmo lembra. “Com 12, 13 anos, já plantava feijões, ajudava na vendinha dos meus avós, que no interior se chamava Secos e Molhados. Mais tarde ficava imaginando em ter um produto diferenciado na região, que não sofresse com a concorrência. Daí nasceu a ideia de cultivar ervilhas”.

A experiência foi determinante na trajetória de Juscelino. Ele foi até Bragança Paulista comprar sementes, preparou a terra que ficava no terreno do avô e planejou colher mais de 400 quilos de ervilha. “Conforme a colheita foi crescendo, fui me animando. Queria cortar o atravessador e fui direto nos pontos fazer uma pré-venda direta com os comerciantes pensando ‘agora eu vou tirar o pé da lama’”.

Ele recorda que o bairro inteiro o ajudou a colher ervilha. Já na entrega ao primeiro comprador, o baque: as ervilhas estavam estragadas. “Disseram que eu plantei ervilha torta, que é um outro tipo. Deveria ter colhido antes”.

O começo como garçom

Em 1987, na Casa Arão, Juscelino embarcava no setor que transformaria sua vida. Desolado com a primeira desventura empreendedora, aos 17 anos recebeu um convite para deixar Joanópolis e trabalhar como garçom no estabelecimento, uma pequena lanchonete e restaurante de bairro na capital paulista. Pela manhã ficava na chapa fazendo lanches; bauru, virado paulista, contrafilé a cavalo. O resto do tempo era dedicado a atender os clientes. “Gostava muito disso, acho que herdei da minha avó, que amava receber as pessoas”.

Juscelino sempre estampa um sorriso largo no rosto. É um otimista inveterado. Talvez por isso, com gorjetas gordas e amizades feitas com a freguesia, as portas foram se abrindo. Alguns dos clientes eram gerentes de banco que, aos finais de semana, frequentavam restaurantes nos Jardins, bairro nobre da cidade. “Eles me falavam que eu tinha perfil pra trabalhar nesses estabelecimentos e eu nem sabia onde ficavam os lugares. Depois descobri. Pegava ônibus na avenida Paulista e ia a pé até os Jardins namorar os restaurantes, sonhando que um dia iria simplesmente trabalhar ali”.

Após a experiência como garçom em pizzarias e churrascarias, Juscelino conseguiu finalmente uma oportunidade de emprego nos Jardins, no restaurante Saint Peters, especializado em gastronomia francesa. “Por ser alta gastronomia, havia uma ótima adega de vinhos, então comecei a observar mais esses elementos”. Em 1992, ele conseguiu uma vaga como ajudante de sommelier no conceituado Fasano. Como ainda não tinha muito conhecimento em vinho, comprou o livro “Guia de Tintos & Brancos”, de Saulo Galvão e “mastigou” o conteúdo dia e noite por meses. Capacitou-se com cursos na Associação Brasileira de Sommeliers, participava diariamente de degustações com harmonização e, assim, foi se aprofundando neste universo.

A primeira viagem internacional à trabalho (e também da vida) foi com destino ao Chile, em 1995. Em uma visita com um grupo de sommeliers à Vinícola Concha y Toro, Juscelino diz que foi tratado como um nobre vindo de outro país. “Lembro que quando abriu o portão, gigantesco por sinal, charretes guiadas por cavalo foram nos buscar, os maîtres com smoking, espumantes e música clássica. Pensei comigo: ‘não é possível um caipira como eu ser recebido feito uma autoridade’. Em 1996, uma nova viagem o marcou profundamente, para a região da Toscana, na Itália, que futuramente iria influenciar diretamente na cozinha de seu primeiro negócio.

O nascimento do Piselli

“Sou muito fiel às empresas em que trabalhei, mas sempre lembrava do meu avô dizendo que até os 35 anos o homem tinha que estar "aprumado na vida". E eu ficava com isso na cabeça vendo vários proprietários de restaurantes que haviam sido maîtres ou sommeliers anteriormente”, diz Juscelino.

Intuitivamente, o sommelier ficava anotando em um caderninho as suas ideias; como deveria ser o cardápio, a carta de vinhos, a decoração do lugar. Foi numa aula de italiano que veio o insight. “Ouvi o nome piselli, que quer dizer ervilha e tomei um susto. Me lembrei dos tempos de Joanópolis, tentando vencer na vida vendendo ervilha e meu coração disparou. Pensei na hora; ‘o nome do meu restaurante vai ser Piselli’.

Juscelino saiu então por São Paulo procurando um ponto comercial para abrir seu empreendimento. Tinha dinheiro suficiente apenas pra dar um sinal na compra do imóvel. “Dei um cheque calção de 20% do valor total e fiz o projeto do negócio numa folha de sulfite. Vendi algumas cotas por 10% e fiquei sendo o sócio majoritário. Fizemos uma reforma no local que durou dois anos e, 12 meses após a inauguração, tive o retorno de todo o meu investimento. Foi surpreendente o movimento. O Piselli é realmente uma ervilhinha muito especial”, recorda.

No estabelecimento, que fica nos Jardins, atender bem para encantar o cliente é o mantra da equipe. Produtos especiais, como o Café Piselli, o Chá Piselli e o Breasola Dela Casa, são destaques. O sucesso foi tão grande que uma espécie de filial do Piselli foi inaugurada, dessa vez com o nome Piselli Sud, com os pratos voltados para o sul da Itália, com azeites e peixes permeando todo o cardápio.

Hoje, ao lado dos sócios Walter Rossi, Renata Russo e o chef Marcelo Martino, abriu em 2014 a holding Hervilha, que ele chama de “um time de apaixonado pela criação de novas marcas”, que engloba o Timo Cucina, o El Carbón e o Del Plin, este último, no Rio de Janeiro. Sempre obstinado, ele conclui: “não consigo não ser empreendedor”.

Saiba mais sobre o Piselli: piselli.com.br

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