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Quem éramos, quem somos e para onde devemos trilhar?

Pela sua duração e vitalidade, a revista Bares & Restaurantes se mostra como um caso de sucesso. É o único meio de comunicação de um setor de pequenas empresas com tantos anos de vida. Nós a criamos com recursos próprios.

Na época eu era sócio de sete casas noturnas e restaurantes bem-sucedidos e achava que tinha obrigação de dar um retorno ao setor e ao país. E assim se manteve até ser adquirida pela Abrasel Nacional, na gestão Célio Salles como presidente do Conselho de Administração.

Antes da criação da revista comparecemos ao sindicato de restaurantes de São Paulo para tentar convencer o então presidente a fazer algo parecido ou transformar seu jornal. A publicação aparecia com mais de vinte fotos do presidente cumprimentando o comandante da polícia, cortando fitinha de inauguração de uma sala redecorada, abraçado com o vereador fulano de tal.

Gostaríamos de um jornal que falasse da realidade do setor, seus problemas, formas de combatê-los, de remover obstáculos, dar consciência a categoria sobre seus direitos, propor ou apoiar a aprovação de leis que a interessavam e etc.

Visitas inúteis foram deixadas de lado, partimos para fazer a revista e criamos o primeiro número, eu exercendo meu aprendizado de jornalista. Tinha formação incompleta na USP, mas já escrevia na Veja, Estadão e outros jornais. Trabalhamos intensamente, para tornar a revista viável.

Logo nos primeiros números, falávamos da carga tributária, informalidade, fiscalizações arbitrárias e corruptas, e tantos outros temas polêmicos, melhor lembrados logo abaixo, problemas, enfim, que os presidentes de sindicatos da época procuravam deixar de lado e até elogiavam empresas que nos criavam problemas em trocas de “patrocínios”.

Claro que os anúncios dessas empresas rareavam, mas em compensação a revista adquiria credibilidade e se expandia.

No primeiro número, surgiu um desses episódios, o conflito entre a verdade e o lado comercial: fizemos uma pesquisa para saber qual o whisky importado era o mais vendido nos bares da cidade. E entre os três primeiros colocados, que sairiam em foto na capa, nenhum era o Teachers, cujo distribuidor era um dos empresários que mais apoiavam a Abredi (futura Abrasel) em São Paulo.

Venceu o espírito que estimulou a criação da revista: vínhamos para falar a verdade, e ganhar respeito dos leitores e então publicamos os resultados.

Perdemos o patrocinador, mas o episódio fez a revista crescer, ganhar credibilidade de norte a sul do país, era lida por lideranças e fazia lideranças, levantava e divulga argumentos, contribuía para formar a opinião de um setor que não tinha um acervo cultural, sequer de informações que pudesse contribuir para busca de avaliações de sua importância, de seus interesses como setor da classe empresarial.

Algumas lideranças sindicais tinham recursos de sobra (contribuições obrigatórias), mas jamais ousavam ter políticas ou meios de comunicação combativos, que contrariassem interesses de grades fornecedores ou autoridades. A RBR contribui decisivamente para que o setor se conhecesse a si próprio, formasse lideranças autênticas.

A Abrasel, entidade combativa, transparente, democrática, qualidades que inexistiam em boa parte dos meios sindicais tradicionais, havia poucas e honrosas exceções, foi intensamente apoiada pela revista, que era propositalmente enviada a todos os estados, todos os estabelecimentos que saiam no Guia 4 Rodas, no do Josimar Melo, de Danúsia Bárbara no Rio de Janeiro, nos que se destacavam nas mais remotas regiões do país.

A revista Bares & Restaurantes cumpriria sua função, informar, formar opinião, levantar problemas do setor e soluções, separar os políticos que ajudavam na remoção dos que impunham mais obstáculos.

Deu sua contribuição para que o setor se organizasse e chegasse ao que é hoje, com os congressos da Abrasel prestigiado por presidente e senadores da República, dezenas de deputados, presidentes de grandes empresas, empresários de bares e restaurantes de todos os estados.

Agora enfrentando a crise dos meios impressos, a revista Bares & Restaurantes não só resiste e se mantém como caso único, como já vai se transferindo com armas e bagagem para os meios eletrônicos.

A revista continua sendo uma forma das lideranças tomarem conhecimento ou discutirem problemas em profundidade. Em um país tão vasto, com tantos diferenciais, com um milhão de estabelecimentos pulverizados de norte a sul, só isso justifica o esforço de mantê-la na linha de frente, sua finalidade de nacionalizar a discussão de eventuais soluções.

“Em 1996, as primeiras edições apontavam os objetivos a serem perseguidos. Em 2021, constata-se que a maioria foi conseguido. Assim é a Bares & Restaurantes, a história das bandeiras do setor”

A Bares & Restaurantes apontava nos seus primeiros motivos qual a situação do setor, como era, totalmente desorganizado e desprestigiado e como deveria ser. Para mudar era preciso mudar a consciência dos proprietários e demais personalidades envolvidas com bares e restaurantes.

Era um setor em si, ou seja, existia mas não se via, não tinha clareza de sua força, de funcionar como um setor econômico, os proprietários como se fossem uma classe empresarial.

Hoje o setor existe para si, sabe-se ver, reconhecer suas potencialidades, sua contribuição com serviços, empregos, econômica, tributos, gastronomia, alegria, pela contribuição ao turismo, e em tantos outros campos.

O setor pode ser reconhecido agora, em sua grandeza, como se percebe no Congresso Abrasel, no seu acesso tranquilo e imediato a qualquer autoridade da República.

A entidade já é uma das dez mais influentes do país, nenhum setor isolado consegue fazer congresso com as dimensões do que adquiriu os da entidade. Nesse ponto, os preciosos exemplares existentes são documentos históricos, mostram o caminho dessa trajetória.

A número um já apontava o número de bares e restaurantes no Brasil, faturamento, número de funcionários, passou a ser espécie de documento oficial, reconhecido inclusive em estudos, pesquisas, principalmente pelas lideranças, autoridades e mídia.

A pesquisa feita pela Bares & Restaurantes com base em pontos de venda da Brahma, Coca Cola e outros fornecedores é comparada na mesma edição com a da Nielsen, o mais prestigiado da época, mostrando coerência e ser m ais completa.

A Nielsen não contava o interior do Nordeste e Centro Oeste e outros lugares de difícil avaliação.

Interessante notar que algumas partes do Brasil tinham que ser pesquisados indiretamente: as favelas cariocas só tinham um ponto de venda de cervejarias, pois subir o morro era perigoso e então apenas o revendedor era autorizado pelos traficantes; também cerca de cem quilômetros após Manaus era região desconhecida para as grandes empresas, que chegando até ali, entregavam produtos levados por revendedores rios acima.

Ainda nesse número uma notícia curta apontava um fornecedor que não queria trocar um equipamento defeituoso vendido a um pequeno restaurante. Em uma semana o equipamento foi trocado e muitas dessas correções de conduta passaram a ocorrer quando se ameaçava noticiar o fato (sempre após constatar a procedência).

Um artigo propagava a maravilha da Internet e como ela seria importante nos anos seguintes. Outras notícias falavam de entidades como ABREDI (SP) , ABRE (DF) E ABRE (DF), que se juntariam a Abrasel logo em seguida. Outra revelava a fundação da ABAGA, associação da alta gastronomia, que muito faria pela culinária brasileira.

“Prefeitura Ataca o Danton pela sétima vez” e “DECON indicia presidente da ABREDI, Presidente da ABREDI denuncia o Decom” relatavam a guerra do presidente da ABREDI e editor da revista Percival Maricato contra o Prefeito Paulo Maluf e contra um órgão todo poderoso da policia que iria ser fechado pelo governador Mario Covas, dando fim a terrível pandemia de corrupção e opressão contra o setor.

Um artigo manifestava-se por reformas na legislação trabalhista, que iriam sendo conquistadas ao longo dos anos.

A Bares & Restaurantes, basta ler os artigos, teria muita importância nas alterações. Os nomes e telefones dos deputados e senadores estavam inseridos em outra reportagem, para fazer sugestões, reclamações, pressão: ensinavam-se os primeiros passos para lidar com o Congresso e á parte, com câmaras de vereadores, prefeitos, governadores, enfim, autoridades, povo que o setor achava inacessível na época. Ou seja, iniciava-se a fase de submissão e omissão e passava-se a fase de combate e conquistas.

E com ela vinham reportagens tabus, como a formação de monopólios e abuso do poder econômico por fornecedores, excessos tributários, burocracia e corrupção impedindo alvarás, comissões abusivas de empresas de vale refeição e cartão de crédito, preconceito contra bares e bebidas alcoólicas, perseguição ou corrupção em órgãos públicos, abusos de fiscalizações do juizado de menores, a parcialidade da Justiça do Trabalho, contribuições sindicais, antitabagismo nos estabelecimentos.

Outras matérias diziam do conhecimento prático sobre gastronomia, gestão, marketing, administração financeira, tributos, lançamentos, tendências, como a expansão que vinha ocorrendo dos restaurantes por kilo, orientações jurídicas, introdução dos primeiros softwares específicos do setor.

Paralelamente haviam as amenidades: happy hours, entrevistas, tendências em gastronomia e vida noturna, premiações, conquista das mesas nas calçadas.

Logo na na 3 há uma foto de um rapaz já maduro, o chef Laurent Suadeau, entregando o prêmio chef revelação dado pela ABREDI a um rapaz chamado Alex Atala, do Restaurante Filomena e outra notícia em que Sergio Bezerra assumia a presidência da ABRASEL.

Uma extensa reportagem, “ A Crítica Não é de Deus nem do Diabo”, mostrava as opiniões que os chefs tinham dos críticos gastronômicos e a defesa destes explicando como faziam as avaliações.

O que se percebe é que um caminho era apontado e foi seguido. E que a RBR conta a história do setor, como nenhum livro poderá fazê-lo, pois nos momentos vividos.

Após cerca de dez anos de vida, dirigida por Percival Maricato, quando a nada fácil missão de publicá-la a cada dois meses passou a Abrasel.

*Percival Maricato é Advogado e Conselheiro da Abrasel em São Paulo.

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